
Pai e filho estavam em casa, calmamente. O Pai mexia nos livros espalhados na secretária, tentando ordená-los. O filho estava sentado, lendo um livro, ou, aparentemente, folheando-o.
O pai levantou os olhos olhando pela janela e viu o mar colorido pelos raios de sol que nele se espraiavam. Abriu-se-lhe a boca de espanto, ante a beleza que saindo daquela paisagem inundava todo o seu ser. Ficou parado... só olhando.
O rapazinho, devagarinho aproximou-se do Pai. As mãos suaves agarraram-se às suas pernas e disse simplesmente:
- Estou aqui! Sou eu!
O pai pegou-lhe ao colo, beijo-lhe os cabelos com suave cheiro perfumado e levou-o até à janela. Ficaram os dois a olhar o mar, que dali se avistava, até nele perderem a vista...
- Pai, as ondas nunca param de querer entrar pela terra dentro?
- Querem abraçar a Terra, como eu te estou a abraçar a ti!...
- E quando se abraça alguém, é porquê?
- É porque se gosta dessa pessoa que abraçamos. É uma manifestação de amor!
- Ah! ... então o ar também deve gostar muito da Terra!... Está a abraçá-la de noite e de dia...
- Pois é, meu filho! É como dizes...
- E o mar também quer abraçar sempre a Terra, porque vai e vem, e vem e vai, e abraça-a tantas vezes...
- É assim o amor verdadeiro. Nunca se cansa, nunca pára de homenagear a quem quer bem!
- Pai, Pai, queres ser sempre comigo como o Mar é com a Terra?
- Sim, meu querido! É assim que vai acontecer, gostarmos muito um do outro!
- Mas, ó Pai, por vezes os abraços do mar são muito violentos, trazem ondas, vagas, remoínhos, podem destruír...
- Pois é. meu querido! Mas todas as ondas, vagas, correntes, tempestades, só existem à superfície. Lá no fundo, em águas profundas, permanece sempre a serenidade e a suave ondulação.
- Então e como se faz para evitar essa tão grande força agitada que nos pretende abraçar e que nos pode matar?
- Devemos afastar-nos da superfície, onde todas essas tempestades ocorrem e dirigir-nos para o fundo do nosso mar, sem quaisquer tipos de culpa, à procura da paz.
O menino, embora não entendesse muito bem, abraçou-se mais ao Pai e os olhos de ambos perderam-se no momento e no seu infinito mar, olhando o mesmo ponto longínquo.
José António
6 de Abril de 2006
(foto de José António)